Cecília Mattos Advocacia

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Incidência do ICMS sobre transporte de mercadoria de exportação e a lacuna legislativa específica

Projeto de pesquisa apresentado ao Departamento de Pós Graduação e Extensão da Sociedade De Ensino Superior Estácio de Sá, como requisito parcial à obtenção do grau de especialista.

Maria Cecília Fernandes de Mattos Crispim
Curso de Pós Graduação Metodologias e Gestão para EAD
Pólo de Resende, RJ

 

RESUMO

 O presente trabalho de conclusão de curso tem como objetivo principal o estudo da incidência do ICMS sobre o transporte de mercadorias destinadas à exportação e a lacuna legislativa específica sobre o tema. Será apresentado uma breve síntese sobre o panorama da exigência do ICMS sobre a circulação de mercadoria destinada à exportação mesmo diante da ausência de legislação específica e da vedação por meio da norma contida na Constituição da República Federativa do Brasil, sem prejuízo do princípio da legalidade que norteia o direito tributário. Para tal, utilizou-se de materiais doutrinários, legislativos, jurisprudenciais e artigos on-line, sendo o presente trabalho apresentado na forma bibliográfica, descritiva, histórica e documental.  

SUMÁRIO

 1 – Introdução. 2 – O Princípio da Legalidade. 3 – A Previsão Constitucional. 4 – O Artigo 155, Inciso II e Parágrafo 2º, Inciso X, Alínea a da Constituição da República Federativa do Brasil. 5 – O ICMS. 6 – ICMS e as Mercadorias para Exportação. 7 – Considerações Finais. Referências Bibliográficas.  

1- INTRODUÇÃO

 O presente artigo tem por objetivo discutir a exigência do ICMS sobre a circulação de mercadorias destinadas à exportação, mesmo sem previsão legal expressa específica para a questão. Será analisado o cenário em que, mesmo diante da ausência de previsão legal específica, violando o princípio da legalidade, muitos estados exigem o pagamento do ICMS sobre a circulação de mercadorias destinadas à exportação. Note-se que circulação é a expressão que trata da mudança/transferência, a qual se refere à titularidade, sendo, portanto, a situação de alguém ter a disponibilidade jurídica sobre um bem, independentemente de ser ou não ser seu proprietário. Conforme citação de Carazza:

Tal circulação só pode ser jurídica (e não meramente física). A circulação jurídica pressupõe a transferência (de uma pessoa para outra) da posse ou da propriedade da mercadoria. Sem mudança de titularidade da mercadoria, não há falar em tributação por meio do ICMS. Esta ideia, abonada pela melhor doutrina (Souto Maior Borges, Geraldo Ataliba, Paulo de Barros Carvalho, Cleber Giardino etc.), encontrou ressonância do próprio STF. 1

Note-se que o ICMS é um imposto que decorre do transporte de mercadorias e prestação de serviços, tais como, o transporte intermunicipal e interestadual. Destaca-se que a ausência de previsão específica da referida tributação sobre a circulação de mercadorias é quanto à legalidade na incidência do ICMS sobre a circulação das mercadorias destinada especificamente à exportação. Nesse cenário, verifica-se que, mesmo diante da ausência de previsão legal específica, violando o princípio da legalidade, alguns estados exigem o pagamento do ICMS sobre o transporte de mercadorias destinadas à exportação, do remetente ao porto, sob o fundamento equivocado de se tratar de prestação realizada dentro do território nacional, artigo 2º., inciso II, da lei complementar 76/96, ignorando a especificidade do caso. No entanto, em que pese não haver norma específica que prescreve a legalidade quanto à incidência de ICMS sobre o transporte de mercadorias destinadas à exportação, há previsão expressa quanto a não incidência do ICMS sobre a circulação de mercadorias destinadas à exportação no texto da Carta Magna, mais especificamente no prescrito por meio do artigo 155, inciso II e parágrafo 2º., inciso X, alínea “a”, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.  

2- O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

O princípio da legalidade no direito tributário data de tempos remotos, sendo difundido como oriundo primitivamente da Carta Magna Inglesa, de 1215, do Rei João Sem Terra. Há escritos de que, naquele tempo, os nobres e a plebe, em união de empenhos se insurgiram em face do poder unipessoal de tributar imposto pelo rei. No cenário acima narrado, foi imposto ao soberano um estatuto, com a finalidade de inibir a atividade tributária opressiva do referido governante. Tal fato, buscava a aprovação prévia dos súditos para a cobrança de tributos, tendo culminado com a representação “no taxation whith out representation”. O ilustre doutrinador Aliomar Baleeiro, sobre esse aspecto, ensina:

[…] Nas suas origens, a legalidade em matéria tributária, como autoconsentimento ou autotributação, ou como defesa da economia privada à ação do poder público, é conquista prévia e anterior à autorização orçamentária e à anualidade […] As bases políticas das limitações ao poder de tributar vêm provavelmente da Idade Média, quando se desagrega a estrutura estatal e o rei perde força frente aos senhores feudais, os quais, por “vontade própria”, e não por imposição anuem ao pagamento de tributos. RASTELLO, em seu Diritto tributário (nota 13, p. 207), observa que as prestações patrimoniais do senhor do feudo, nos primeiros tempos, têm caráter voluntário e de subsídio  oferecido  ao  Estado  (são  os donum,  benevolence, joyeuse entrée etc. help, adiutorum, aide, susidy, Stuer de stuern – ajudar). Com      a decadência do feudalismo e o reforço da autoridade estatal, posteriormente o sentido dessa terminologia começa a ser alterado, destacando-se a conotação de dever (cf. AUGUSTO FANTOZZI. Diritto tributário. Torino: Utet, 1991. 70). Por isso, o princípio da legalidade dos tributos, antes de afirmar-se na Revolução Francesa e de manifestar-se enquanto princípio fundamental do Estado de Direito no constitucionalismo do século XIX, derivou primeiro, como registra OTTMAR BÜHLER, do corporativismo  medieval  (ver Princípios  de  derecho  internacional tributário. Tradução: Fernando Cervera Torrejin. Madrid: Ed. de Derecho Financiero, 1968. p.200). Seus precedentes históricos montam ao século XI, sendo, portanto, anteriores à Carta Magna Inglesa de João-Sem-Terra. Corresponderam ao princípio da autotributação, vale dizer, ao juízo de que os encargos tributários deveriam ser previamente consentidos por aqueles que o suportassem. VICOTR UCKMAR (Princípios comuns de direitos constitucional tributário. Tradução: Marco Aurélio Greco. São Paulo: RT, 1976. p. 10-20), citando MITCHELL (Taxation in medieval England. New Haven, 1951. p. 158), lembra os seguintes fatos que exemplificam o princípio da autotributação nos séculos XI e XII: a promessa de Anselmo a William Rufus, em 1906, de quinhentas libras esterlinas, repelida pelo rei, por insuficiente, teve na recusa do arcebispo um empecilho para ser aumentada; a autotributação eclesiástica, consagrada no Lateran Council. de 1179; as decisões de 1188, que instituíram o tributo de um décimo da renda, foram tomadas com a intervenção pessoal de Henrique II a fim de se obter o consentimento da cidade ao pagamento; incidente semelhante se dá em 1192, quanto ao recolhimento de cem mil libras esterlinas, necessárias para resgatar Ricardo I etc. Também consignado na famosa Carta do século XIII, o princípio da legalidade ali foi mantido intocado. Paulatinamente alargou-se a concepção do prévio consentimento, antes limitado a segmentos privilegiados da população, com a declaração do princípio da representação através do Act of Appropriation (1626), da compilação do Petittion of Rights (1628) e do Bill of Rights (1688) em que se exigia a imposição de tributos por ato do Parlamento […]2

Baleeiro continua, com as seguintes considerações:

[…] não só na Inglaterra, como também em outros Estados, já na Idade Média, se praticava o prévio consentimento ou a autotributação (cf. op.cit. p. 16-20). Finalmente, em França, os estados já tinham postulado, em 1735, a faculdade de aprovar os impostos, regra que integrou a Declaração de Direitos (1789) e a Constituição de 1791 […]3 A Carta Magna vigente por meio do inciso II do artigo 5º. prescreve que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei, o que dá lastro ao princípio da legalidade, garantia individual explícita nos termos expressos do art. 150, caput, a qual se encontra seguramente protegida entre as cláusulas de pedra da Lei Maior (art. 60, § 4º, IV). Artigo 150 CF/88: Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos municípios: I – Exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça; 4 […] a origem desse princípio, de natureza nitidamente política, está ligada a luta dos povos contra a tributação não consentida, desde a Idade Média […] 5

Ensina Roque Carrazza, referindo-se à lei como limitação ao exercício da competência tributária:

De fato, em nosso ordenamento jurídico, os tributos só podem ser instituídos e arrecadados com base em lei. Este postulado vale não só para os impostos, como para as taxas e contribuições que, estabelecidas  coercitivamente,  também invadem a esfera patrimonial privada. No direito positivo pátrio o assunto foi levado às últimas consequencias, já que uma interpretação sistemática do Texto Magno revela que só a lei ordinária (lei  em  sentido orgânico-formal) pode  criar ou aumentar tributos. Dito de outro modo só à lei -tomada na acepção técnico- específica de ato do Poder Legislativo, decretado em obediência aos trâmites e formalidade exigidos pela Constituição – é dado criar ou aumentar tributos. 6

Tão robusto é o papel do Princípio da Legalidade no Brasil, que Pontes de Miranda viu-se impelido a cunhar-lhe novo rótulo, dada a sua especificidade e a despeito de riqueza da língua-mãe. Batizou-o de “legalitariedade”.7 Nesse contexto, resta explícito que o texto constitucional delega à lei complementar, além de outras atribuições, regular as limitações constitucionais ao poder de tributar, sendo essa lei o próprio Código Tributário Nacional. Nessa senda, oportuno se faz destacar ainda que a lei ordinária é o meio pelo qual são instituídos os tributos, diferentemente das leis complementares que possuem atribuições detidamente definidas diretamente da Constituição Federal. Por meio da EC nº 32 resta expresso que a possibilidade de o Poder Executivo instituir e majorar impostos vai de encontro ao princípio da legalidade, haja vista, medidas provisórias não ter o condão de tratar das matérias que tendam a instituir ou majorar tributos. Por esse viés, verifica-se que as medidas provisórias a teor do preceito constitucional não podem tratar de assuntos relativos aos das leis complementares em razão da incompatibilidade estrutural, vez que as leis complementares possuem um regime de tramitação diverso e bem mais demorado e especificado que o das medidas provisórias, as quais tem como pressupostos relevância e urgência da medida. Diante do exposto, verifica-se, também não ser possível instituir tributos por meio de leis delegadas, entretanto, no que se refere às obrigações acessórias, não há óbices para que tanto Medidas Provisórias quanto Leis Delegadas disponham sobre tal tema. Por fim, verificamos que não existem propriamente nos exatos termos exceções ao Princípio da legalidade no direito tributário, na realidade, conforme a doutrina menciona a Constituição Federal apenas faculta ao Poder Executivo Federal a alteração de alíquotas (e não das bases de cálculos) de alguns tributos com a finalidade de regulação extrafiscal.  

3- A PREVISÃO CONSTITUCIONAL

O princípio da legalidade surgiu no mesmo período em que o Estado de direito, na contramão do poder arbitrário e autoritário exercido naquela época, e, passou a ter previsão  na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, após a Revolução Francesa de 1789. No texto da Constituição Federal de 1988, além do previsto por meio do art. 5º, II, temos tal previsão estampada também no art. 37, compondo um dos princípios que norteiam a Administração Pública. Tal previsão se verifica ainda no expresso por meio do art. 84, IV, o qual traz a competência privativa do Presidente da República para sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, assim como estende tal competência para expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução. A Constituição Federal de 1824 já trazia em seu bojo o princípio da legalidade no expresso por meio do artigo 179, inciso I, in verbis:

Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Políticos  dos  cidadãos brasileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e  a propriedade,  é garantida pela Constituição do Império, pela maneira seguinte: I – Nenhum cidadão pode ser obrigado a fazer, ou deixar de fazer alguma cousa, senão em virtude de Lei.8

Já na primeira Constituição  Federal  Republicana, datada de  1891, o princípio em da legalidade foi esculpido no do artigo 72: Art. 72.  A Constituição assegura a brasileiros e a  estrangeiros, residentes no país a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade nos termos seguintes:

Art. 72.  A Constituição assegura a brasileiros e a  estrangeiros, residentes no país a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade nos termos seguintes:
  • 1º Ninguém pode ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma cousa, senão em virtude de lei.
(…) 30. Nenhum imposto de qualquer natureza poderá ser cobrado senão em virtude de uma lei que o autorize.9

O texto constitucional de 1934 dispôs em seu artigo 113 o transcrito abaixo:

Art. 113. A Constituição assegura a brasileiros e estrangeiros residentes no país a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à subsistência, à segurança individual, e à propriedade, nos termos seguintes: (…) 2) Ninguém será obrigado a fazer, ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude de lei.10

A Carta Magna de 1946 ratificou o princípio da legalidade por meio da dicção do artigo 141, §§ 2º e 34º.

Art. 141 – A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, a segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes: § 2º Ninguém pode ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. § 34 – Nenhum tributo será exigido ou aumentado sem que a lei o estabeleça; nenhum será cobrado em cada exercício sem prévia autorização orçamentária, ressalvada, porém, a tarifa aduaneira  e  o  imposto  lançado  por  motivo  de guerra.11

A Lei Maior datada de 1967, traz o princípio em comento expresso no artigo 153, § 2º, e no artigo 19, inciso I.

Art 153 – A duração do estado de sítio, salvo em caso de guerra, não será superior a sessenta dias, podendo ser prorrogada por igual prazo. § 2º – Se o Congresso Nacional não estiver reunido, será convocado imediatamente pelo Presidente do Senado Federal. Art 19 – Compete à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios arrecadar: I – os impostos previstos nesta Constituição;12

Destaca-se que o princípio da legalidade, ou, como também é nominado: princípio da reserva absoluta da lei formal foi destacado pelo legislador constituinte de 1988, o qual ratificou e reforçou a obrigatoriedade desse princípio em matéria tributária ao fazer constar expresso por meio do artigo 150, inciso I, vedação à União, aos Estados,  ao  Distrito Federal e aos Municípios em exigir ou aumentar tributos sem lei que o estabeleça. A previsão trazida por meio do artigo 37 da Carta Magna de 1988 aplicado à Administração Pública, traduz a ideia de que é preciso resguardar o contribuinte  da aplicação de tributos arbitrários, asseverando que a lei tributária deve proteger o contribuinte, estabelecendo previamente o fato que, se, e quando, ocorrido, nos termos previstos em lei, dará surgimento à obrigação do contribuinte em recolher os valores determinados a título de tributo em benefício do ente de direito. Salienta-se que toda previsão sobre a exigência ou majoração de tributos deve constar expressa no comando legal e se apresentar completa. É por meio do expresso no parágrafo anterior que, o entendimento majoritário da doutrina tributária caminha no sentido de  que o princípio da legalidade tem hodiernamente  o mesmo cunho do da reserva legal aplicável à seara do Direito Penal,  dada  a  especificidade elevada à categoria de princípio da tipificação tributária. O princípio da tipificação tributária prescreve que deverá ser assegurado a todos os contribuintes a certeza e a segurança de que a tributação só terá seu conteúdo especificado por lei, em seu sentido formal (instrumento normativo proveniente do poder legislativo) e material (norma jurídica geral, impessoal, abstrata e compulsória), impedindo qualquer tipo de interferência seja de que natureza for, por arbitrário. Nesse parêntese, oportuno se faz pontuar que, a lei ordinária, no direito tributário, tem a função de criar ou majorar tributos, sendo as medidas provisórias, as emendas constitucionais e a lei delegada amparo à legislação tributária, e, não podem ser consideradas como principais meios legislativos de criação de tributos. Mister se faz enumerar, também, as exceções abarcadas por meio do texto constitucional vigente, estampadas nos artigos abaixo expressos:

Art. 153 §1. é facultado ao Poder Executivo, atendidas as condições e os limites estabelecidos em lei, alterar as aliquotas dos impostos enumerados nos incisos I, II, IV e V. Art. 155, IV. as aliquotas do imposto serão definidas mediante deliberação dos Estados e Distrito Federal, nos termos do §2°, XII,g, observando-se o seguinte; (incluído pela Emenda Constitucional N° 33, de 2001). Art. 177. §4, I,b. reduzida e estabelecida por ato do Poder Executivo, não se lhe aplicando o disposto no art. 150.III,b; (incluído pela Emenda Constitucional N/ 33, de 2001). Art. 97 §2° do CTN. Não constitui majoração de tributo, para os fins do disposto no inciso II deste artigo, a atualização do valor monetário da respectiva base de cálculo.13

Segundo Alexandre:

[…] outro ponto de importância é que, apesar de o princípio da legalidade não possuir exceções quanto à criação de tributos, contemplas-as, todavia, para sua majoração. No texto originário da Constituição Federal 1988 eram previstas apenas quatro exceções, quais sejam a possibilidade de alteração, dentro dos limites legais, das alíquotas dos impostos de importação (II), de exportação (IE), sobre produtos industrializados (IPI) e sobre operações financeiras (IOF). 14

Nesse panorama, resta demonstrado de forma geral as pontuações acerca do princípio da legalidade nos textos constitucionais que nortearam as relações jurídicas ao longo da história do Brasil.

 

4 – O ARTIGO 155, INCISO II E PARÁGRAFO 2º. INCISO X, ALÍNEA ‘a’ DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993) § 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993) X – não incidirá: a) sobre operações que destinem mercadorias para o exterior, nem sobre serviços prestados a destinatários no exterior, assegurada a manutenção e o aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações e prestações anteriores; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)15

Por meio da previsão expressa acima destacada, verifica-se que não há legalidade na cobrança de ICMS sobre o transporte de mercadorias destinadas à exportação, por ausência de previsão legal. Nessa toada, ausente a previsão expressa da exação de tributação de ICMS a título de transporte de mercadoria destinada à exportação, e, presente a vedação por meio do dispositivo constitucional acima transcrito, resta claro, que a exigência de tributo a título de ICMS sobre o transporte de mercadoria destinada à exportação além de inconstitucional viola o princípio da legalidade, o que a torna arbitrária. Isto posto, a cobrança de imposto sobre a circulação de mercadoria destinada ao comércio exterior, exportação, gera ao contribuinte o direito subjetivo de buscar a tutela jurídica no sentido de afastar a exigência e/ou em caso de pagamento a devolução por meio da medida administrativa e/ou judicial cabível.

 

 

5 – O ICMS

O ICMS (Imposto sobre operações relativas à circulação e mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual, intermunicipal e de comunicação) é de competência exclusiva dos Estados e do Distrito Federal. A regulamentação do ICMS está prevista na Lei Complementar 87/1996 – Lei Kandir, alterada posteriormente pelas Leis Complementares 92/97, 99/99 e 102/2000.

O ICMS, imposto estadual, sucessor do antigo Imposto de Vendas e Consignações (IVC), foi instituído pela reforma tributária da EC n.18/65 e representa cerca de 80% da arrecadação dos Estados. É gravame plurifásico (incide sobre o valor agregado, obedecendo-se ao princípio da não cumulatividade – art. 155, parágrafo 2º. I, CF), real, (as condições da pessoa são irrelevantes) e proporcional, tendo, predominantemente, um caráter fiscal. Ademais, é imposto que recebeu um significativo tratamento constitucional – art. 155, parágrafo 2º., I, ao XII, da CF, robustecido pela LC n.87/96, que substituiu o Decreto-lei n.406/68 e o Convênio ICMS n.66/88, esmiuçando-lhe a compreensão, devendo tal norma ser observada relativamente aos preceitos que não contrariem a Constituição Federal.16

Na Constituição Federal de 1988, o atual ICMS é previsto como um tributo de natureza fiscal e extrafiscal, concomitantemente, porque constitui importante fonte de receita aos Estados e ao Distrito Federal, ao mesmo tempo em que tem a função de propiciar a facilitação da circulação de mercadorias essenciais. Trata-se de tributo indireto. Tal tributo na atual Constituição surgiu com o intuito de substituir o imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias (ICM), ampliando sua materialidade e, distribuindo competência antes restrita à União. Insta salientar que os tributos indiretos distinguem o contribuinte de fato do contribuinte de direito. O contribuinte de direito é a pessoa de quem o ente de direito pode exigir o imposto, por meio da norma de incidência tributária, desde que concretizado no mundo real o fato correspondente ao fato gerador do tributo nela expresso, conforme estabelece hipoteticamente o antecedente da norma ao instituir uma relação jurídica de caráter obrigacional, envolvendo tanto o sujeito ativo (Estado), quanto o sujeito passivo (contribuinte ou responsável), e que, tem por objeto o pagamento do tributo. Já o contribuinte de fato é a pessoa que arcaria apenas com o ônus do tributo, o qual se encontra embutido no preço da mercadoria, do produto, do serviço, dentre outros, nominado de “repercussão financeira” do tributo. Na trilha do expresso por meio do art. 155 CR/88, a base do fato gerador do ICMS é a circulação de mercadoria ou prestação de serviços interestadual ou intermunicipal de transporte e de comunicação, ainda que tal fato tenha se iniciado no exterior.

O fato gerador do ICMS descrito na Constituição Federal é atinente a operações relativas à circulação de mercadorias. Portanto, o fato gerador indica quaisquer atos ou negócios independentemente da natureza jurídica específica de cada um deles, que implicam a circulação de mercadoria, assim entendida a circulação capaz de realizar o trajeto de mercadoria da produção até o consumo.17

Na doutrina de Ataliba:

Sempre que haja relação jurídica negocial, de um lado, e mercadoria, de outro (como objeto daquela) – relação na qual um dos sujeitos (o que detém mercadoria) é titular dos direitos de disposição sobre ela e os transfere (operação) a outrem – haverá circulação.18

Outrossim, a hipótese de incidência do ICMS recai sobre uma obrigação de dar uma mercadoria, ora consubstanciada em uma operação jurídica.

Operações, no contexto, exprime o sentido de atos ou negócios hábeis para provocar a circulação de mercadorias. Adquire, neste momento, a acepção de toda e qualquer atividade regulada pelo Direito, e que tenha a virtude de realizar aquele evento. 19

Para Ataliba e Giardino, as operações “são atos jurídicos; atos regulados pelo Direito como produtores de determinada eficácia jurídica; são atos juridicamente relevantes.”20

Machado ensina:

Se a Constituição fala de mercadoria ao definir a competência dos Estados para instituir e cobrar o ICMS, o conceito de mercadoria há de ser o existente no Direito Comercial. Admitir-se que o legislador pudesse modificá-lo seria permitir ao legislador alterar a própria Constituição Federal, modificando as competências tributárias ali definidas. 21

O artigo 191 do CC anterior ao CC vigente, previa que:

É unicamente considerada mercantil a compra e venda de efeitos móveis ou semoventes […] contanto que nas referidas transações o comprador ou vendedor seja comerciante. Tal dispositivo foi revogado pelo CC/02, nos termos do artigo 2.045 das Disposições Finais e Transitórias: Revogam-se […] a Parte Primeira do Código Comercial, Lei nº. 556, de 25 de junho de 1850.22

Nesse sentido, o CC/02, traz a previsão de, basicamente, as mesmas regras, contudo, com outras palavras. Paralelamente, declara com ênfase, pois, no artigo 79 “são bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente”. Greco sobre o assunto assegura que:

Um exame do termo mercadoria a) no âmbito constitucional, b) no âmbito legal e c) mesmo no contexto interno da própria LC 70/91 indica que seu significado alcança apenas os bens móveis e não os imóveis. (…) O termo mercadoria encontra na Constituição Federal nítido perfil, alcançando apenas os bens móveis. A discriminação constitucional de competências procura, em mais de uma oportunidade, separar as incidências que correspondam a bens imóveis (ITBI, IPTU, ITR) da incidência sobre bens móveis (ICMS). (…) O termo mercadoria com objeto da mercancia também alcança apenas bens móveis (Cód. Com., art. 191) (…) O termo mercadoria tem sentido circunscrito aos bens móveis, tanto é assim que o legislador, quando quis definir a incidência de contribuições de maneira mais abrangente, utilizou o termo bens (p. ex., Lei n. 9.715/98) ou previu singelamente receita bruta sem especificar qualquer tipo de atividade de que decorra (p. ex., Lei n. 9.718/98).23

Ao seu modo, a doutrina de Direito Comercial articula que “chamam-se mercadorias as coisas que comerciantes adquirem com a finalidade específica de revender.”24 Ante o exposto, considera-se mercadoria os bens móveis que são adquiridos para realização de atos de comércio e a incidência dos tributos, conforme restou demonstrado, não ocorre somente com a circulação da mercadoria, mas também, nas operações relativas à circulação de mercadorias.  

6 – ICMS E AS MERCADORIAS PARA EXPORTAÇÃO

José Eduardo Soares de Melo define mercadoria como sendo:

(…) bem corpóreo da atividade profissional do produtor, industrial e comerciante, tendo por objeto a sua distribuição para consumo,  compreendendo-se  no  estoque da empresa, distinguindo-se das coisas que tenham qualificação diversa, como é o caso do ativo permanente.25

Visando desonerar as exportações brasileiras a Lei Complementar nº 87/96, artigo 3º, inciso II, que introduziu significativas alterações na legislação do ICMS, estabeleceu que sobre as operações e prestações que destinem ao exterior mercadorias ou serviços não haverá incidência do ICMS. O referido benefício teve origem no artigo 155, inciso X, alínea “a”, da Constituição Federal. São equiparadas à exportação a saída de mercadoria realizada com o fim específico de exportação para o exterior, quando destinada a: a– empresa comercial exportadora, inclusive tradings ou outro estabelecimento da mesma empresa; b– armazém alfandegado ou entreposto 26 Diante do exposto, verifica-se que os serviços de transportes de mercadorias destinadas  à  exportação  estão  excluídos  do  campo  da  incidência  do  ICMS,  consoante o disposto no artigo 3º, inciso II, da Lei Complementar nº 87/96. Sendo assim, os serviços de transportes realizados por empresas transportadoras do estabelecimento exportador até o porto ou aeroporto não serão tributadas pelo ICMS. No entanto, admite-se o crédito dos impostos (ICMS e IPI) relativo a matérias- primas, produtos intermediários e material de embalagem adquiridos para emprego na industrialização de produtos destinados à exportação saídos com imunidade ou suspensão ou as mercadorias e serviços que venham ser objeto de operações ou prestações destinadas ao exterior As operações relativas à circulação jurídico-econômica das mercadorias dizem respeito as negociações com propósitos econômicos, ou seja, negociações com ganho de capital pelo menos a uma das partes no plano contratual que promove a dinâmica jurídica do bem através da transferência de sua titularidade do patrimônio de um sujeito para outrem. Deve-se levar em consideração que a mera circulação sem a finalidade de lucro e bem como transferência de titularidade não constitui o fato gerador do ICMS. Por exemplo,  já foi pacificado por meio da Súmula 573 do STF que o comodato não se caracteriza como operação mercantil: Fato Gerador do Imposto de Circulação de Mercadorias  – Saída Física  de Máquinas, Utensílios e Implementos a Título de Comodato.27 Bem como, não constitui fato gerador do imposto de circulação de  mercadorias  a  saída física de máquinas, utensílios e implementos a título de comodato.

De acordo com o artigo 3º, inciso II, da Lei Complementar nº 87/96, o ICMS não incide sobre operações e prestações que destinem ao exterior mercadorias, inclusive produtos primários e produtos industrializados semi-elaborados, ou serviços, entre os quais se inclui obviamente o transporte interestadual e/ou intermunicipal que apenas destine mercadoria ao mercado externo, não necessariamente leve a mercadoria para o estrangeiro. A adoção de posicionamento diverso a este é deveras relevante à desoneração das operações de exportação: nesta hipótese, as operações de empresas que remetem suas mercadorias destinadas à exportação para portos e/ou aeroportos, ou ainda que operam com empresas comerciais exportadoras, são oneradas pelo ICMS incidente sobre o transporte destas mercadorias a estes locais (que em regra é cobrado pelo regime de substituição tributária). Alguns tribunais administrativos caminham na trilha do que dispõe o artigo 3º, inciso II, da Lei Complementar nº 87/96, como o faz, por exemplo o Conselho de Contribuintes do Estado de Minas Gerais, vejamos: PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DE TRANSPORTE RODOVIÁRIO DE CARGAS – PRESTAÇÃO     INTERESTADUAL     –     MERCADORIA     DESTINADA    A EXPORTAÇÃO – Em se tratando a operação de circulação de mercadoria de saída para o exterior de produto industrializado, a prestação de serviço de transporte a ela relativa também se caracteriza como internacional, não sendo, pois, alcançada pela Incidência do ICMS, devido ao fato de não haver previsão legal para a sua cobrança. Impugnação procedente. Decisão pelo voto de qualidade. (CC-MG – Ac. 11.8777 / 97 / 2ª – Relª Luciana Mundim de Mattos Paixão – DOU 24.09.1997, rep. 30.09.1997) Mas os Fiscos Estaduais em geral entendem que incide o ICMS sobre a prestação de serviço de transporte interestadual de mercadorias destinadas à exportação ou à empresa comercial exportadora, já que realizado dentro do território nacional. Fundamentam-se inciso II do artigo 2º da LC nº 87/96. É o caso, por exemplo, da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo que, na Reposta à Consulta nº 20/05, entendeu o seguinte: “quando o trajeto envolver mais de um Município, configura-se uma prestação de serviço de transporte intermunicipal ou interestadual, já que essa prestação autônoma não está destinando mercadorias diretamente ao exterior e seus efeitos se exaurem dentro do território nacional”, porquanto “a prestação de serviço de transporte internacional é aquela efetuada “porta a porta”, por um mesmo transportador, desde um ponto situado dentro do território nacional até outra fora do território nacional. Mas o STJ pôs abaixo este entendimento em recente decisão. De acordo com a decisão proferida no EREsp nº 710.260/RO (julgado em 27/02/08 e divulgado no Informativo STJ nº 346 – 25 a 29 de fevereiro de 2008), a 1ª Seção do STJ entendeu que não incide o ICMS na operação de transpor interestadual de produto destinado ao exterior. Segundo esta decisão, à configuração do transporte de mercadoria destinada à exportação não é necessário que o transportador entregue a mercadoria de um ponto do território nacional a um outro no exterior. Basta que a destinação da mercadoria seja ao exterior, independentemente de o transporte, em si, não levar a mercadoria para fora do país. Este julgamento é importante porque é o primeiro da 1ª Seção nesse sentido. Com esta pacificação, as empresas que remetem diretamente suas mercadorias destinadas à exportação para portos e/ou aeroportos, ou ainda que operam com empresas comerciais exportadoras, podem pleitear a completa desoneração de suas operações de venda ao exterior. 28

O exposto, revela uma aparente contradição entre o posicionamento do STJ e o STF sobre o assunto em baila. O Superior Tribunal de Justiça – STJ, ao tratar do assunto, desde antes da alteração constitucional, realizada em 2003, especificamente quanto ao aspecto infraconstitucional, sempre se posicionou no sentido de que seriam isentos/imunes do ICMS as prestações de serviços de transporte de mercadorias destinadas ao exterior. É o que se pode observar:

Tributário – ICMS – serviço de transporte de mercadoria destinada ao exterior – não incidência. A Lei Complementar nº 87/96 prevê a não-incidência do ICMS na prestação de serviços de transporte de mercadorias destinadas à exportação. Reveste-se de ilegalidade as limitações impostas pela Portaria nº 026/99 – SEFAZ – ao gozo deste benefício fiscal pelas empresas exportadoras, porquanto restringe direito resguardado por lei complementar, em flagrante ofensa ao princípio da hierarquia das leis. Recurso improvido.29 TRIBUTÁRIO. ICMS. TRANSPORTE INTERESTADUAL DE MERCADORIA DESTINADA AO EXTERIOR. ISENÇÃO. ART. 3º, II DA LC 87/96. 1. O art. 3º, II da LC 87/96 dispôs que não incide ICMS sobre operações e prestações que destinem ao exterior mercadorias, de modo que está acobertado pela isenção tributária o transporte interestadual dessas 2. Sob o aspecto teleológico, a finalidade da exoneração tributária é tornar o produto brasileiro mais competitivo no mercado internacional. 3. Se o transporte pago pelo exportador integra o preço do bem exportado, tributar o transporte no território nacional equivale a tributar a própria operação de exportação, o que contraria o espírito da LC 87/96 e da própria Constituição 4. Interpretação em sentido diverso implicaria em ofensa aos princípios da isonomia e do pacto federativo, na medida em que se privilegiaria empresas que se situam em cidades portuárias e trataria de forma desigual os diversos Estados que integram a Federação. 5. Embargos de divergência 30 PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. ICMS. TRANSPORTE DE MERCADORIA DESTINADA AO EXTERIOR. ISENÇÃO.
  1. A orientação da Primeira Seção do STJ pacificou-se no sentido de que “o art. 3º, II da LC 87/96 dispôs que não incide ICMS sobre operações e prestações que destinem ao exterior mercadorias, de modo que está acobertado pela isenção tributária o transporte interestadual dessas mercadorias”, sendo que, “sob o aspecto teleológico, a finalidade da exoneração tributária é tornar o produto brasileiro mais competitivo no mercado internacional”.
Assim, “se o transporte pago pelo exportador integra o preço do bem exportado, tributar o transporte no território nacional equivale a tributar a própria operação de exportação, o que contraria o espírito da LC 87/96 e da própria Constituição Federal” (EREsp 710.260/RO, Primeira Seção, Rel. Min. Eliana Calmon, DJe de 14.4.2008).
  1. Agravo Regimental não 31

O STF, por sua vez, analisando os aspectos constitucionais, antes da vigência da redação do art. 155, § 2.º, X, “a”, trazido pela emenda Constitucional n.º 42/2003, entendia que a imunidade tributária seria restrita às operações de exportação de produtos, não abrangendo os serviços de transporte interestadual ou intermunicipal dos referidos bens. É o que vê:

Ementa: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. TRIBUTÁRIO. SERVIÇO UTILIZADO NO TRANSPORTE INTERESTADUAL OU INTERMUNICIPAL DE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS DESTINADOS AO EXTERIOR. PRETENDIDA NÃO INCIDÊNCIA DO ICMS. ART. 155, § 2º, X, A, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. A imunidade tributária prevista no artigo 155, § 2º, X, a, da Constituição Federal é benefício restrito às operações de exportação de produtos industrializados, não abrangendo o serviço utilizado no transporte interestadual ou intermunicipal dos referidos bens. 2. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental a que se nega provimento.32 Ementa: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. TRIBUTÁRIO. SERVIÇO UTILIZADO NO TRANSPORTE INTERESTADUAL OU INTERMUNICIPAL DE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS DESTINADOS AO EXTERIOR. PRETENDIDA NÃO INCIDÊNCIA DO ICMS. ART. 155, § 2º, X, A, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. A imunidade tributária prevista no artigo 155, § 2º, X, a, da Constituição Federal é benefício restrito às operações de exportação de produtos industrializados, não abrangendo o serviço utilizado no transporte interestadual ou intermunicipal dos referidos bens. 2. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental a que se nega provimento.33 Como se pode observar, de uma leitura cuidadosa do inteiro teor das referidas decisões, o STF tem sempre se manifestado no sentido de que a imunidade tributária prevista no art. 155, §2.º, X, “a” da Constituição Federal, excludente da incidência do ICMS as operações que destinem ao exterior produtos industrializados, não seria aplicável as prestações de serviços de transporte. 34 Assim, anteriormente à EC n.º 42 de 2003, o STF firmou tal orientação nos já mencionados Recursos Extraordinários n.º 196.527/MG e n.º 212.637/MG, os quais, como acima exposto, tomaram de suporte a discussão na qual os prestadores de serviços de transporte desejaram interpretar de forma ampla o vocábulo operações, a fim de que tais serviços fossem incluídos na regra imunizante, vez que de fato, a eles não se referia a redação da alínea “a”, do inciso X do §2.º do art. 155 Carta de 1988.35 Nota-se, contudo, que embora a Suprema Corte tenha mantido tal posição mesmo após a EC n.º 42 de 2003, os precedentes por ela examinados referem-se exclusivamente a julgados que analisaram a questão da imunidade segundo a redação anterior a esta Emenda Constitucional n.º 42 de 2003.36 Assim, não restam dúvidas quanto ao grave equívoco cometido pelo Colendo Supremo Tribunal Federal, ao afastar a imunidade para as prestações de serviços de transporte de mercadorias destinadas a exportação, com base em legislação inaplicável aos casos.37

 

 

7  – CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do breve estudo apresentado, por meio do presente artigo, verifica-se que as relações de direito tributário, desde os primórdios, é tutelada pelo princípio da legalidade, o qual abarca a previsão de que não se pode exigir o pagamento de um imposto sem que o mesmo apresente norma formal e material de direito que o defina. Desta feita, não atendido os requisitos legais aptos a consubstanciar a legalidade do comando legal por meio do qual haja uma legítima previsão de instituição e exigência do tributo, não há o que se falar em exação. No entanto, alguns estados mesmo violando os preceitos jurídicos que norteiam a matéria, insistem em exigir o ICMS sobre a circulação de mercadorias destinadas à exportação. Já com relação à aparente contradição entre o entendimento exarado pelo STJ e STF, mister se faz destacar que não há qualquer contradição, haja vista grave equívoco em fundamentar a legalidade da exigência de tal imposto legislação superada sem considerar a atual redação do dispositivo constitucional, trazido na EC no. 42/2003. Ante todo o exposto, mister se faz quando presente a exação arbitrária na circulação de mercadoria destinada à exportação, caberá ao profissional do direito no exercício de sua função por meio de medida cabível na defesa contribuinte, o qual foi violado em seu direito, lance mão da tutela por meio do manejo da medida cabível a fim de assegura o direito constitucionalmente assegurado que restou violado.   Maria Cecília Fernandes de Mattos Crispim OAB/RJ 199.992  


  1 CARRAZA, Roque Antonio, ICMS.11ª.ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006, p. 39. 2 BALEEIRO, Aliomar (1905-1978). Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar – 8 ed. atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. – Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 79-80. 3 Idem 4 BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 5 HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário. 19ª ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 359. 6CARRAZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 22ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006. 7MIRANDA, Pontes de. Comentários à Constituição de 1967 com a Emenda nº 1 de 1969, t. V, 3. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1987, p. 1. 8 BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1824. 9 BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1891. 10 BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1934. 11 BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1946. 12 BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1967. 13 BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 14 ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 6ª ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2012. 15 BRASIL, op. cit. 16 SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário – 10ª. edição – São Paulo: Saraiva Educação, 2018. 17 Idem 18 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária. 3ª. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994, p. 26-27. 19 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 14ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 363. 20BALLEEIRO, 1999, p.  376  apud  LINSINGEN, 2001 https://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/artigo/2304/imposto-circulacao-mercadorias-servicos>       Acesso em 18.07.2019. 21 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 27ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006, p. 130. 22 BRASIL, Código Civil de 1916. 23 Autor desconhecido. Revista Dialética n. 51, p. 134-135. 24 MARTINS. 1998, p. 473). MARTINS, Fran. Curso de Direito Comercial. 22ª. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998. 25 PAULSEN, Leandro. MELO, José Soares de. Impostos Federais, Estaduais e Municipais. 8. Ed. Ver. E atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2013, p. 237. 26 BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 27 STF. Súmula 573. 28 BERGAMINI, Adolpho. Não Incidência Do ICMS Sobre Transporte de Mercadoria Destinada à Exportação. Tributario.net,   São Paulo, a. 5,  11/4/2008. Disponível  em http://www.fiscosoft.com.br/a/49ea/nao-incidencia-do-icms-sobre-transporte-de-mercadoria-destinada-a- exportacao-adolpho-bergamini Acesso em: 06/05/2008. 29 STJ. REsp 418.957/MT, Rel. Ministro Garcia Vieira, Primeira Turma, julgado em 25/06/2002, DJ 26/08/2002, p. 179. 30 STJ. EREsp 710.260/RO, Rel. Ministra Eliana Calmon, Primeira Seção, julgado em 27/02/2008, DJe 14/04/2008. 31 STJ. AgRg no REsp 1379148/SC, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 15/08/2013, DJe 16/09/2013. 32 STF. RE 602399 ED, Relator(a): Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, julgado em 15/12/2015, Acórdão Eletrônico Dje-059 Divulgado em 31-03-2016 Publicado 01-04-2016 33 Idem 34 MARTINS, André Arraes de Aquino, Não Incidência De ICMS Sobre Transporte Para Exportação. Disponível  em  http://hmp.adv.br/da-indevida-exigencia-de-icms-sobre-operacoes-de-transporte-de- mercadorias-destinadas-a-exportacao-uma-analise-em-conjunto-com-a-jurisprudencia-do-stf-e-do-stj  Acesso em 18.07.2019. 35 Idem 36 Idem 37 Idem  


 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 6ª ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2012. ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária. 3ª. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994. Autor desconhecido. Revista Dialética n. 51. BALEEIRO, Aliomar (1905-1978). Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar – 8 ed. atualizada por Misabel Abreu Machado Derzi. – Rio de Janeiro: Forense, 2010. BALLEEIRO,  1999, p.376 apud LINSINGEN,  2001 https://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/artigo/2304/imposto-circulacao-mercadorias- servicos> Acesso em 18.07.2019 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 14ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 363. BERGAMINI, Adolpho. Não Incidência do ICMS Sobre Transporte De Mercadoria Destinada À Exportação. Tributario.net, São Paulo, a. 5, 11/4/2008. Disponível em  http://www.fiscosoft.com.br/a/49ea/nao-incidencia-do-icms-sobre-transporte-de-mercadoria- destinada-a-exportacao-adolpho-bergamini Acesso em: 06.05.2008. BRASIL, Código Civil de 1916. BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1824. BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1891. BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1934. BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1946. BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1967. BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. CARRAZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 22ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006. CARRAZA, Roque Antonio, ICMS.11ª.ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006. HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário. 19ª ed. São Paulo: Atlas, 2010. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 27ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006. MARTINS. 1998, p. 473). MARTINS, Fran. Curso de Direito Comercial. 22ª. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998. MARTINS, André Arraes de Aquino, Não Incidência De ICMS Sobre Transporte Para Exportação.  Disponível em http://hmp.adv.br/da-indevida-exigencia-de-icms-sobre- operacoes-de-transporte-de-mercadorias-destinadas-a-exportacao-uma-analise-em-conjunto- com-a-jurisprudencia-do-stf-e-do-stj   Acesso em 18/07/2019. MIRANDA, Pontes de. Comentários à Constituição de 1967 com a Emenda nº 1 de  1969, t. V, 3. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1987. PAULSEN, Leandro. MELO, José Soares de. Impostos Federais, Estaduais e Municipais. 8. Ed. Ver. E atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2013. SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário – 10ª. edição – São Paulo: Saraiva Educação, 2018. STF. RE 602399 ED, Relator(a): Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, julgado em 15/12/2015, Acórdão Eletrônico Dje-059 Divulgado em 31-03-2016 Publicado 01-04-2016 STF. Súmula 573. STJ. AgRg no REsp 1379148/SC, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 15/08/2013, DJe 16/09/2013. STJ. EREsp 710.260/RO, Rel. Ministra Eliana Calmon, Primeira Seção, julgado em 27/02/2008, DJe 14/04/2008. STJ. REsp 418.957/MT, Rel. Ministro Garcia Vieira, Primeira Turma, julgado em 25/06/2002, DJ 26/08/2002, p. 179.

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